Consulta técnica perante órgãos reguladores | Uma ferramenta de tomada de decisão em projetos inovadores

agosto 25, 2021

No aquecido mercado de Startups, com frequência, empreendedores se queixam do excesso de regulamentação imposta por órgãos regulatórios do setor em que atuam, ou pretendem atuar. Para inovar na área da saúde, do mercado financeiro ou securitário, por exemplo, deve-se sempre estar atento às exigências de entidades como a Anvisa, CVM, Bacen, Susep.

A cautela aumenta quando se trata de desenvolver ideias inovadoras e disruptivas, que, por definição, não encontram parâmetros comparativos no mercado. Por vezes, diante da dúvida e insegurança, projetos são engavetados ante o receio de autuações e multas: perde o empreendedor, perde a sociedade, perde o país.

Nesse contexto, a consulta perante órgãos reguladores pode se apresentar como importante aliada no desenvolvimento de inovação, na medida em que permite submeter a ideação ao ente regulador suscitando dúvidas acerca de enquadramento ou interpretação de legislação regulatória.

De forma simplificada, a consulta consiste em perguntar, por escrito, ao órgão regulador se determinado fato, ou situação fática ainda não ocorrida, se enquadra ou não em norma. Assim, caso o empreendedor tenha dúvida sobre se o serviço ou produto que idealizou deve ou não deve atender a exigências regulatórias, pode-se consultar o órgão antes mesmo de desenvolver seu projeto, é o que se denomina consulta em tese.

Em matéria tributária, a consulta é instrumento amplamente utilizado pelos contribuintes, área em que o instituto se encontra devidamente normatizado no âmbito federal, com previsão de formalidades e requisitos a serem cumpridos para sua eficácia, assim como seu efeito vinculante.

Em outros setores, no entanto, essa ferramenta é menos explorada, não obstante a existência de normas gerais que preveem direitos e garantias aos usuários de serviços públicos da administração pública, direta e indireta. 

O artigo 12, da Lei 1.346/17, estabelece o direito do usuário à efetiva resolução de suas manifestações, o que compreende: (i) recepção da manifestação no canal de atendimento adequado; (ii) emissão de comprovante de recebimento da manifestação; (iii) análise e obtenção de informações, quando necessário; (iv) decisão administrativa final; e (v) ciência ao usuário. 

Assim, independentemente da área de atuação, o empreendedor tem direito de formular consulta perante órgãos da administração pública – ainda que da administração indireta, como é o caso das agências reguladoras – mas, sobretudo, tem o direito de obter pronunciamento formal sobre matéria de seu interesse.

Para maximizar os benefícios, é recomendável que a consulta contenha no mínimo dois requisitos: (a) a descrição detalhada dos fatos objetos da consulta, se possível, com o desenho do processo de negócio, ou passo a passo da operação e exemplos de fatos hipotéticos; e (b) a indicação dos dispositivos da legislação que ensejaram a dúvida.

Realizada a consulta, o ente se pronunciará indicando qual a interpretação da administração pública sobre a matéria que lhe foi submetida e indicará os motivos que conduziram ao entendimento exposto. É normal o ente regulador apontar qual o enquadramento legal da matéria ou até mesmo indicar que o produto ou serviço idealizado não se submete à regulação específica, hipótese em que o empreendedor pode prosseguir com maior liberdade a execução de seu plano.

De qualquer forma, a solução de consulta tem o condão de instruir a decisão do empreendedor sobre prosseguir ou não com o desenvolvimento de seus projetos, orientando-o sobre cumprimento da legislação e evitando riscos de autuações futuras.

É importante mencionar que a solução de consulta não impede a fiscalização pelo órgão regulador. Mas, se em procedimento fiscalizatório for constatado que a situação fática in loco se amolda àquela apresentada pelo consulente, a solução de consulta terá o condão de vincular a administração. Isso porque os entes regulatórios se submetem aos princípios da legalidade, segurança jurídica e boa-fé, de modo que não é dado à administração pública autuar o administrado em contrariedade aos termos de solução de consulta por ela própria proferida.

Portanto, a consulta técnica realizada perante órgãos reguladores consiste em importante ferramenta para auxiliar empreendedores na tomada de decisão e desenvolvimento de projetos inovadores. Pode ser utilizada ainda na fase de ideação do produto ou serviço, dirimindo dúvidas ao empreendedor acerca do tratamento legal da matéria. 

Além disso, as soluções de consulta transmitem confiança ao mercado por meio da segurança jurídica, o que fomenta investimentos no mercado Startups e traz benefícios à sociedade com a disponibilização de novos serviços e produtos, assim como a geração de empregos.  Ganha o empreendedor, a sociedade e país.

Por Arthur Sabino

¹ Art. 100, do CTN e IN RFB 1396/2013.
² REsp 1462156/SC, Rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, SEGUNDA TURMA, julgado em 08/09/2020, DJe 16/10/2020.
³ Art. 37, caput CF, art. 2º, caput, e parágrafo único, inciso IV, da Lei 9.784/1999.

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